sábado, 12 de agosto de 2017

CRIMINALIZAÇÃO DO DIA DOS PAIS

Amanhã é Dia dos Pais. Pretendo aproveitar a comemoração enquanto posso. Será que os meus filhos e netos vão comemorar o Dia dos Pais?

O Dia dos Pais está em extinção. Eu diria que está, até mesmo, sendo criminalizado. A tendência das escolas descoladas (sem perdão pelo cacófato) é abolir o Dia dos Pais. E as escolas mais tradicionais que teimam em comemorar a data são severamente criticadas no FaceBook. Nunca li tanta reclamação contra o Dia dos Pais.

Não é que haja criança sem pai. Todo mundo tem pai, ao menos no sentido biológico. Ainda não inventaram a partenogênese. Toda a criança resulta da meiose de dois gametas, masculino e feminino. Isso é da vida e continuará assim enquanto a tecnologia não tornar a reprodução sexual obsoleta. O que acontece é que muitas crianças não têm pais, no sentido de homens que desempenhem esse papel social e que se vinculem afetivamente a elas, que estejam presentes na sua vida, que as criem e ajudem suas mães a cria-las, que invistam no seu desenvolvimento etc.

O investimento parental masculino é um dos temas mais interessantes da psicologia evolucionária (Geary, 2000, 2005). Ao contrário do investimento parental materno, o investimento paterno não é tão incondicional assim. Em espécies com fertilização interna, como a humana, a evolução do cuidado parental masculino dependeu de três fatores principais: 1) Necessidade do cuidado paterno para o desenvolvimento da prole; 2) Ausência de oportunidades de acasalamento adicional; e 3) Certeza da paternidade (vide Tabela 1).

Tabela 1 - Investimento parental masculino (cf. Geary, 2000)

As transformações sociais, familiares e sexuais ocorridas nos últimos sessenta anos criaram um ambiente inóspito para o florescimento do cuidado paternal. Para um contingente significativo de homens contemporâneos parece mais atraente uma estratégia reprodutiva quantitativa de investir em novas oportunidades de acasalamento do que a estratégia qualitativa de investir na prole. O resultado é um número crescente de crianças que cresce sem pai e que tem seu desenvolvimento ameaçado por essa privação (Woessman, 2015, Ziol-Guest al., 2015).

Nos países do Hemisfério Norte, 14% das crianças vivem atualmente em famílias monoparentais (21% dos EUA) (Woessman, 2015). Esses indivíduos apresentam pior desempenho escolar (vide Figura 1), permanecem menos tempo na escola, têm menor probabilidade de concluir uma faculdade, se envolvem mais com drogas, sexo inseguro e comportamentos anti-sociais e apresentam maior incidência de gravidez na adolescência e vínculos conjugais instáveis.   


 Figura 1 - Déficit relativo no desempenho em matemática de jovens de 15 anos oriundos de famílias monoparentais (Dados do PISA 2012, cf. Woessner, 2015).

A tendência é que essas crianças que crescem privadas de pai reproduzam ao longo da sua vida as condições da família de origem nos seus relacionamentos interpessoais (Belsky et al., 1991, vide Figura 2).

Figura 2 - Transmissão intergeracional de estratégias reprodutivas e suas conseqüências psicossoaiciais (cf. Belsky et al., 1991).

Por mais simpatia que se tenha pelas crianças que crescem sem pais, abolir o Dia dos Pais não vai resolver o problema. Ao contrário, só vai piorar a desagregação familiar e todas suas conseqüências nefastas. Muitos pais biológicos não assumem seus papéis sociais paternais e as crianças  se prejudicam por causa disso. Abolir o Dia dos Pais e “desconstruir” a paternidade por comiseração não vai resolver o problema. Mais esperto seria adotar políticas, costumes e valores que estimulassem a paternidade. De modo que um número maior de crianças e jovens pudesse comemorar o Dia dos Pais.

Referências

Belsky, J., Steinberg, L., & Draper, P. (1991). Childhood experience, interpersonaldevelopment, and reproductive strategy: an evolutionary theory ofsocialization. Child Development, 62, 647-670.

Geary, D. C. (2000). Evolution and proximate expression of human paternal investment. Psychological Bulletin, 126, 55-77. 

Geary, D. C. (2005).  Evolution of paternalinvestment.  In D. M. Buss (Ed.), The evolutionary psychology handbook (pp. 483-505).  Hoboken, NJ:  John Wiley & Sons.

Woessman, L. (2015). An international look at the single-parent family. Education Next, Spring.

Ziol-Guest, K. M., Duncan, G. J., &  (2015). One-parentstudents leave school earlier.  Education Next, Spring.

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