A jornalista Ruth de Aquino parece ter comprado a tese de Lula e dos petralhas
sobre o crime do bem. Em artigo recente, muito bem escrito por sinal, ela
chamou atenção para alguns aspectos por assim dizer “positivos” ou “generosos”
da personalidade de Eike Batista.
Os aspectos extravaganes da
personalidade de Eike Batista são conhecidos. Mereceriam uma análise
psiquiátrica. No artigo, Ruth de Aquino chamou atenção para a “generosidade” de
Eike, relatando vários episódios que atestam sua generosa impulsividade. A qual
se revestia, inclusive, de tinturas de ostentação megalomaníaca.
Ficamos sabendo então, que Eike
era muito dedicado ao trabalho, muito empreendedor, muito criativo, muito amigo
dos amigos etc. Também ficamos sabendo que doou somas vultosas para a Santa
Casa, para as crianças pobres etc. Ou seja, Eike não é apenas um crápula. Ele tem um lado humano também. E daí?
Para não pensar mal da ilustre
autora, vou apenas comentar que os objetivos do seu texto parecem não ser muito
claros. Vou dizer então que não fica muito claro o que ela pretende apelando
para o lado novela da Globo da personalidade de Eike. O apelo emocional é
óbvio. Até eu fiquei sensibilizado. Como o Eike tem um personalidade
fascinante!
Mas o que isso tem a ver com os
crimes que Eike cometeu? A jornalista Malu Gaspar escreveu um livro inteiro
sobre os esquemas de Eike Batista (“Tudo ou nada: Eike Batista e a verdadeira
história do Grupo X”, Record). A maioria dos golpes aplicados por Eike Batista
tinha uma estrutura muito simples. Original, mas simples e, porisso genial.
Durante muitos anos, Eike Batista
funcionou como uma espécie de incorporador de empresas. Assim como muitas
construtoras vendem imóveis na planta, Eike vendia empresas no papel. Nâo sei
como é que ele conseguia fazer isso: ele colocava as ações dos seus projetos à
venda na Bolsa antes que os mesmos tivessem, efetivamente, saído do papel.
Parece que a Bolsa não tinha qualquer tipo de restrição a esse respeito...
Os projetos eram sempre meganlomaníacos
e Eike fazia um fuzuê danado, vendendo sua fumaça. Os projetos nunca saiam do
papel. Quando as empresas começavam a ficar insolventes, ele apelava para
empréstimos, para o governo, ou simplesmente lançava uma nova incorporação.
A coisa funcionou durante muito
anos. Ninguém falava nada contra o Eike. Toda mundo via que o negócio tinha
dente de coelho. Mas ninguém dizia nada. A única pessoa que se levantou contra
o Eike foi o jornalista Diogo Mainardi. Ele causou constrangimento no programa
Manhattan Connection quando perguntou ao vivo e cores para o Eike Batista se as
empresas do vigarista realmente exisitam ou não.
O negócio foi tão bem sucedido
que Eike Batista chegou a, supostamente, se transformar em um dos homens mais
ricos do mundo. Acho que ele ocupou um nicho ecológico, o do empresário
brasileiro genial, aquele que sabia e fazia o Brasil crescer. O Cara que fazia
a Europa se curvar perante o Brasil. O Barão de Mauá ocupou essa posição no
Século XIX. Com a diferença de que o
Barão de Mauá era honesto e assumiu as conseqüências dos riscos que correu.
Inclusive vendendo as jóias da sua esposa para pagar as dívidas. O Barão de
Mauá morreu pobre, mas honrado.
Com o Eike a coisa foi muito
diferente. Como ninguém ousasse desmascará-lo e como contasse com a simpatia da
imprensa, ele foi lesando um número cada vez maior de pessoas, no Brasil e no
Mundo. Até que sua pirâmide implodiu e ele faliu. Um aspecto secundário, mas
não menos importante, é o prejuízo que o Eike Batista causou à imagem
internacional do Brasil e dos empresários brasileiros.
É importante ressaltar que o Eike
era reincidente. Uns vinte e poucos anos atrás ele já tinha dado um golpe
parecido, lesando um grupo empresarial do Canadá. Quando ele ressurgiu com o
Grupo X, houve uma certa resistência no
mercado internacional. A qual ele foi, progressivamente, desfazendo com o seu
charme. A imprensa comprou o mito de que ele tinha o faro para detecatar metais
e petróleo, que era louco mas empreendedor etc.. Diziam até que tinha
recebido os mapas geológicos do subsolo brasileiro do seu pai. Pura balela. Deu
no que deu. O próximo empresário brasileiro genial que quiser se lançar no
exterior vai ter que provar não ser um novo Eike Batista.
E
agora vem essa moça de Aquino nos dizer que tá bom, que o Eike é um
vigarista, que ele deu vários golpes e lesou inúmeras pessoas, mas que ele tem
uma personalidade extravagante e é muito generoso. Isso justifica seus crimes?
Se o cara é charmoso, pode delinqüir? Será que a Ruth de Aquino está endossando
a tese petralha do crime do bem? Ou seja, de que as personalidades que dizem se
preocupar com os mais pobres têm passe livre para delinqüir? Basta lembrar o caso do Lula, cuja ignorância e supostas boas intenções lhe conferiram inimputabilidade eterna.
Mas, se o caso do Eike pode ser comparado ao do Barão de Mauá, por que não aproveitar o embalo e comparar o Lula ao José Bonifácio. Ambos tinham um projeto para o Brasil. Só que o Bonfácio era um cara instruído, honesto e patriota. Não trocaria um Bonifácio por uma tonelada de Lulas.
A comparação desses dois mequetrefes contemporâneos com personalidades ilustres da nossa História serve, por um lado, de consolo. Afinal, a História mostra que já geramos estadistas e empresários decedentes. Por outro lado, não deixa de ser desanimadora. Na falta de um José Bonifácio e
de um Barão de Mauá, temos o Lula e o Eike. Ai que saudades do Século XIX! Pode ser chavão, mas não tem como não citar a célebre frese do Marx sobre o repeteco histórico. Ficamos sonhando com grandes brasileiros que realizem o nosso potencial, mas esquecemos os grandes do nosso passado. Esse é famoso complexo de vira-lata ao qual se referia o Nelson Rodrigues. Parece que hoje eu resolvi pegar forte no chavão. Nem todo mundo tem a oringalidade um Eike e de um Lula.